De Perpetua Virginitate B. Mariae

Caput 22

Et quia de comparatione virginitatis et nuptiarum sum aliqua dicturus, obsecro lecturos ne me putent nuptiis detraxisse in virginum laude, et aliquam fecisse distantiam inter sanctos veteris Testamenti et novi, id est, inter eos qui habuere conjugia, et hos qui a complexu mulierum penitus recesserunt, verum pro conditione temporum alii eos tunc subjacuisse sententiae, et alii nos, in quos fines saeculorum decurrerunt.

Quamdiu lex illa permansit: «Crescite, et multiplicamini, et replete terram» (Gen. I, 28); et, «Maledicta sterilis, quae non parit semen in Israel» (Isai. ultimo sec. LXX), nubebant omnes, et nubebantur, et derelictis parentibus, fiebant una caro.

Quando vero vox illa pertonuit: «Tempus breviatum est: reliquum est, ut et qui habent uxores, sic sint, quasi non habeant; adhaerentes Domino, unus cum eo efficimur spiritus» (I Cor. VII, 29). Et quare?

«Quia qui sine uxore est, cogitat ea quae Dei sunt, quomodo placeat Deo. Qui autem cum uxore est, sollicitus est, quae sunt hujus mundi, quomodo placeat uxori. Et divisa est mulier, et virgo: quae non est nupta, cogitat quae sunt Dei, ut sit sancta corpore et spiritu. Nam quae nupta est, cogitat, quae sunt mundi, quomodo placeat viro» (Ibid., 32, 33 et seqq.).

Quid oblatras? quid repugnas? Vas electionis haec loquitur: «Divisa est,» dicens, «mulier, et virgo...» Vide quantae felicitatis sit, quae et nomen sexus amiserit. Virgo jam mulier non vocatur. «Quae non est nupta, cogitat quae sunt Domini, ut sit sancta corpore et spiritu.»

Virginis definitio, sanctam esse corpore et spiritu; quia nihil prosit carnem habere virginem, si mente quis nupserit. «Quae vero nupta est, cogitat quae sunt mundi, quomodo placeat viro.» Idem tu putas esse diebus et noctibus vacare orationi, vacare jejuniis; et ad adventum mariti expolire faciem, gressum frangere, simulare blanditias?

Illa hoc agit, ut turpior appareat, et naturae bonum infuscet injuria. Haec ad speculum pingitur, et in contumeliam artificis conatur pulchrior esse quam nata est. Inde infantes garriunt, familia perstrepit, liberi ab osculis et ab ore dependent, computantur sumptus, impendia praeparantur. Hinc cocorum accincta manus carnes terit, hinc textricum turba commurmurat: nuntiatur interim vir venisse cum sociis. Illa ad hirundinis modum lustrat universa penetralia, si torus rigeat, si pavimenta verrerint, si ornata sint pocula, si prandium praeparatum.

Responde, quaeso, inter ista ubi sit Dei cogitatio? Et hae felices domus? Caeterum ubi tympana sonant, tibia clamitat, lyra garrit, cymbalum concrepat, quis ibi Dei timor? Parasitus in contumeliis gloriatur: ingrediuntur expositae libidinum victimae, et tenuitate vestium nudae impudicis oculis ingeruntur. His infelix uxor, aut laetatur, et perit: aut offenditur, et maritus in jurgia concitatur. Hinc discordia, seminarium repudii.

Aut si aliqua invenitur domus, in qua ista non fiant, quae rara avis est; tamen ipsa dispensatio domus, liberorum educatio, necessitates mariti, correctio servulorum, quam a Dei cogitatione non avocent? «Defecerunt, » inquit Scriptura, «Sarae muliebria» (Gen. XVIII, 11); post quod dicitur ad Abraham: «Omnia quaecumque dicit tibi Sara, audi vocem ejus» (Gen. XXI, 12). Quae non est in partus anxietatibus et dolore, quae deficientibus menstrui cruoris officiis, mulier esse desiit, a Dei maledictione fit libera: nec est ad virum conversio ejus, sed e contrario vir subjicitur ei, et Domini ei voce praecipitur: «Omnia quaecumque tibi dicit Sara, audi vocem ejus» (Genes. III); et sic incipiunt vacare orationi. Quia quamdiu in conjugio debitum solvitur, orandi praeteritur instantia.

A Virgindade Perpétua de Maria

Capítulo 22

E porque estou, de algum modo, prestes a falar sobre a comparação entre a virgindade e o matrimônio, conjuro aqueles que me lerão a não pensarem que tenho depreciado o matrimônio ao enaltecer as virgens e feito alguma distinção entre os santos do Antigo Testamento e do Novo, ou seja, entre aqueles que tiveram esposas, e os que se afastaram completamente do abraço das mulheres. Na verdade, eu penso que, conforme as circunstãncias da época, os homens estavam, outrora, submetidos a uma regra, e nós, para quem o fim dos tempos chegou, a outra.

Enquanto a lei persistiu: «Sede fecundos, multiplicai-vos e enchei a terra» (Gên. I, 28); e, «Maldita a mulher estéril que não gera rebento em Israel», todos se casavam e eram dados em casamento, e, após deixarem o pai e a mãe, se tornavam uma só carne.

Quando, então, aquela voz trovejou: «O tempo tornou-se breve. Resta que aqueles que têm esposas sejam como se não as tivessem; unindo-nos ao Senhor, constituímos com ele um só espírito» (I Cor. VII, 29; VI, 17). E por que?

Porque «quem está sem esposa, cuida das coisas que são de Deus, do modo de agradar a Deus. Mas quem tem esposa, está cuidadoso das coisas que são deste mundo, do modo de agradar à esposa. E há uma diferença entre a mulher casada e a virgem. A mulher não casada cuida das coisas de Deus, a fim de ser santa no corpo e no espírito. Mas a mulher casada cuida das coisas do mundo, do modo de agradar ao marido» (I Cor. VII, 32-34).

Por que te encolerizas? Por que resistes? O vaso de eleição fala isto, dizendo: «Há uma diferença entre a mulher casada e a virgem...» Vê quanta felicidade há para aquela que perdeu até mesmo a designação de seu sexo. A virgem já não é chamada de mulher. «Aquela que não é casada cuida das coisas do Senhor, a fim de ser santa no corpo e no espírito.»

A definição de virgem é ser santa no corpo e no espírito, porque de nada serve ter uma carne virgem, se a mulher estiver casada em sua mente. «Ora, aquela que é casada cuida das coisas do mundo, do modo de agradar ao marido» Tu pensas que é a mesma coisa dedicar-se à oração, dia e noite, dedicar-se aos jejuns, e, na chegada do marido, embelezar o rosto, suavizar o andar, fingir bajulações?

Aquela age assim para se mostrar mais feia e manchar o bem da natureza com um ato injurioso. Esta se enfeita diante do espelho e, insultando o Criador, tenta ser mais bela do que é por natureza. Em seguida, os infantes tagarelam, os escravos fazem barulho, os filhos carecem de seus beijos e de sua orientação, os custos são computados, as despesas são planejadas. De um lado, a tropa armada dos cozinheiros corta pedaços de carne, do outro, a multidão de tecedeiras murmura entre si. Enquanto isso, o marido se anuncia e chega com seus companheiros. Ela, como uma andorinha, percorre todos os cômodos de sua casa para ver se a cama está arrumada, se varreram os pisos, se taças foram providenciadas, se a refeição está pronta.

Responde-me, eu te peço, no meio de tudo isso, onde está o pensamento de Deus? E estas casas são felizes? Além disso, onde os tambores ressoam, a flauta emite seus sons estridentes, a lira gorjeia, o címbalo retine, que temor de Deus há nesse lugar? O parasita se gloria em meio aos insultos. Entram as vítimas das paixões, expostas, e, nuas sob a tenuidade de suas vestimentas, apresentam-se aos olhares impudicos. A infeliz esposa, ou se alegra com isso, e perece; ou se ofende e seu marido é empurrado para brigas. Neste instante, surge a discórdia, a origem do repúdio.

Ou se porventura é encontrada alguma casa onde estas coisas não acontecem, que ave rara ela é! Contudo, a própria administração da casa, a educação dos filhos, as necessidades do marido, a correção dos servos, como não poderiam desviar do pensamento de Deus? Diz a Escritura: «O que é ordinário às mulheres tinha cessado para Sara» (Gên. XVIII, 11). Depois disso, é dito a Abraão: «Tudo o que Sara te pedir, concede-o» (Gên. XXI, 12). Ela, que não sofre com os desconfortos e a dor do parto, que deixou de ser mulher depois que suas obrigações em relação ao sangue menstrual cessaram, está livre da maldição de Deus. Nem é seu desejo para seu marido, mas, ao contrário, o marido se submete a ela, e é-lhe ordenado pela voz do Senhor: «Tudo o que Sara te pedir, concede-o». E assim eles começam a se dedicar à oração. Porque, enquanto se paga o que é devido no casamento, negligencia-se a constância da oração.